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CRÔNICA DA SEMANA

INFLUENCER

         Para a crônica ser publicada em um dia certo da semana, ela começa a ser gestada muito tempo antes. Gostou da palavra “gestada”? Eu gosto. Porque há semanas que é quase um parto com fórceps para extrair alguma coisa, no mínimo aceitável, dessa minha caixa cerebral.

      Tenho a impressão de que a caixa foi lacrada por um Deus muito bravo comigo. Lacrou e jogou a chave fora. Eu que procure, enquanto Ele dá risada.

        Às vezes, começo um texto toda feliz. O primeiro parágrafo sai fácil, mas do segundo em diante tudo empaca. O texto fica ali a semana toda, aberto no computador, esperando que eu termine. Eu olho para ele, ele olha para mim e o casamento não sai. Não dá nem um namorico de verão. Nada de “match”

     As crônicas são seres com vida própria. Chegam ou vão embora quando bem entendem. Se forem contrariadas, pegam a mala e se despacham para o outro lado do mundo e nada de voltar. Mando cartas, e-mails e mensagens carinhosas de arrependimento, e nada.

        Depois de um parto difícil, costumo ficar cansada e vazia. Olho para a tela do computador e parece tão pouco. Não entendo como aquele texto pequeno, de poucos parágrafos pode ter sugado tanto as minhas forças.

        Ao concluir um texto longo, uma peça de teatro ou um romance, eu compreendo. Passo meses sem poder sequer reler o texto final, ou começar a escrever outra maratona. Entretanto a crônica, minha companheira semanal, deveria ser mais compreensível comigo e não se fazer de difícil.

        Dessa vez, foi tão trabalhoso escrever que fiz algumas promessas que, provavelmente, vou me arrepender no futuro. Ela reclamou que aparecer só uma vez por semana é pouco, quer mais visibilidade. Quando eu argumento que uma vez já está tão difícil, o que dirá duas?! Ela diz que não quer saber. Mandou que eu trabalhe mais. Disse ainda que eu ando muito folgada.

        Respiro fundo e tento não mandá-la catar coquinhos. Para completar diz ainda que quer ser “influencer”. “O quê??” – eu pergunto, aturdida. “In-flu-en-cer” - ela repete pausadamente. Diz que cansou de ver gente falando bobagem e que também quer falar. “Bobagem?” - eu pergunto?? “Claro que não!” - ela responde. Quer aparecer nas redes sociais, ganhar dinheiro e ser famosa. Cansou de ser pobre e desconhecida. E ainda me ameaça: “e se sair alguma bobagem, não se esqueça, a culpa é sua.”

SP 11/11/25

         

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