
Miriam Bevilacqua
Literatura, Comunicação,Educação
CRÔNICA DA SEMANA
AMOSTRA GRÁTIS

Adoro amostra grátis. De qualquer coisa. Principalmente, se for de creme de beleza caro que eu não vou comprar de jeito algum. Estendo a mão e pego os sachezinhos toda satisfeita. Claro que a quantidade é tão pouca que não vai fazer a menor diferença no meu rosto, mas, às vezes, ilusão em amostra grátis também deixa a gente feliz.
Em todos esses anos já vi e peguei amostra grátis de tudo que me ofereceram. Entretanto, não entro em fila, jamais. Vejo uma fila e saio correndo, mas se alguém me oferece quando estou passando, não cabe a desfeita. A pessoa pode ficar triste comigo. Abro o sorriso, pego a amostra, agradeço e vou me embora.
Muitas vezes, nem sei do que é a amostra. Guardo na bolsa ou na sacola e só vou olhar em casa. E foi assim que descobri, no aconchego do lar, um pacote de sopa solúvel. Nunca tinha tomado. Olhei bem a embalagem. Não reconheci a marca. Vi os ingredientes, o modo de fazer, as calorias e confesso que nada me animou. Não parecia comida de verdade.
Coloquei a amostra grátis de sopa na despensa e esqueci o fato.
Muito tempo depois, em uma sexta-feira, tarde da noite, a fome bateu devastadora. A geladeira vazia, a despensa vazia e eu com uma preguiça enorme de pedir entrega e ter de trocar de roupa. Sou antiga. Não recebo entregador de pijama. Tenho vergonha. Foi então que vi em um canto meio escuro do armário a tal sopa amostra grátis.
Como a fome não nos deixa escolha e cega os instintos, resolvi experimentar. Nada mais simples. Esquentar a água e jogar o pó. Jetsons, astronautas, perdidos em uma ilha, tudo isso ia passando pela minha cabeça, enquanto eu olhava aqueles pedacinhos esquisitos de alguma coisa se dissolvendo na água quente.
A embalagem dizia que era um caldo de alho-poró. Experimentei a primeira colherada e não identifiquei qualquer sabor conhecido. Tentei a segunda e a terceira colherada e nada. E assim, de colherada em colherada, tentando descobrir o que era aquilo, tomei a sopa inteira. É duro ter fome!
Duas horas depois, comecei a sentir coisas estranhas. Nunca passei tão mal em toda minha vida. Descobri, do pior jeito, que nem tudo que é grátis é bom. Muitas vezes, é melhor abrir mão do que vem fácil. E isso não vale apenas para sopas solúveis!
SP 30/09/25