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O FUGITIVO

          Cadê o inverno?

         Já fiz planos de caldos e chocolate quente, de lareira com seu fogo embelezando a sala, de gorro e cachecol, mas fiquei só nos planos, enquanto o calor parece que nunca mais vai embora.

          De vez em quando, os meteorologistas até prometem uma queda de temperatura, mas a queda é bem pequenininha e o termômetro sobe muito rapidamente. Não dá tempo nem de estrear aquela malha nova. Estamos vivendo o verão em junho.  Não tem frio nem para beber um vinhozinho quente nas festas juninas. Bem que eu tentei, mas esquentou até o dedão do pé.

         Tenho um monte de casacos no armário esperando para passear, e nada. Eles olham para mim aflitos, pois sabem que seu tempo é curto, mas com certeza nunca imaginaram que não seria curto, seria inexistente.

        Pensei em pôr uma recompensa no jornal. Quem sumiu com o inverno que se apresente. Ou será que foi o inverno que se cansou de nós e resolveu fugir? Talvez tenha ficado cansado de ser tão injustiçado, dessa gente que todo ano fica reclamando do frio.

          Gosto das quatro estações. Não dá pra viver eternamente no verão. Anseio por um calafrio, uma arrepio, de vez em vez. O frio me faz ficar mais reflexiva. É o tempo do ano em que mais produzo poemas. O inverno é o momento da poesia. Não dá para pensar em poesia com o suor escorrendo pelo rosto. Não combina.

          Tem gente que diz que o inverno é cinza. Não concordo. Pra mim, ele é azul. É a época do ano em que o céu fica mais azul e mesmo que o frio seja intenso, ainda assim o azul persiste.

        Nasci no inverno, casei no inverno, tive meu primeiro filho no inverno. Tenho boas lembranças e, mesmo que bata os dentes em alguns dias, que também reclame do frio, ou que às vezes confunda o frio do corpo com o frio da alma, mesmo assim, não vejo a hora de pegar um cobertor xadrez, um bom livro, um xícara de chá bem quente e esquecer o mundo lá fora.

 

SP 25/06/2024

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